Chegamos a Amsterdam em uma tarde ensolarada e agradável de sábado, depois de 3 horas de viagem de Megabus, saindo de Bruxelas. No caminho, paisagens bem bonitas de terrenos alagados, vacas holandesas, moinhos de vento, etc, etc…
No dia em que chegamos, a cidade estava bem cheia pois era o último dia da parada gay. Na recepção do hotel, vimos várias pessoas chegarem e não encontrarem quartos disponíveis. “Talvez vocês encontrem hospedagem nas cidades vizinhas”, era o que a recepcionista dizia para eles.
Como todos os hostels estavam muito caros, ficamos hospedados em um hotel bem legalzinho e mais afastado do centro chamado West Side Inn. O sistema público de transporte de Amsterdam é bem eficiente e tudo pode ser feito de tram, que é tipo metrô, só que por cima. O day pass custa 7,5 euros, e tem validade de 24h, a partir da hora da validação. O passe é vendido dentro do tram, pelo cobrador ou motorista, e tem que ser validado tanto na entrada, quanto na saída, nas maquininhas que ficam ao lado das portas. Uma opção alternativa ao transporte público, é andar de bicicleta, como fazem os “Amsterdamers”. Para quem não é estabanado – como eu – e sabe andar de bicicleta, vale a pena alugar uma para rodar a cidade toda. Amsterdam é a cidade para se andar de bike, até eu fiquei com vontade de arrumar uma pra mim (mas aí lembrei de quando inventei que sabia nadar em Santorini e achei melhor deixar quieto).
Amsterdam é uma cidade tranquila e agradável, cheia de árvores e cortada por sete canais que formam uma paisagem linda e harmoniosa. As casas são tortinhas e inclinadas para a frente, efeito do solo meio que pantanoso sobre o qual foram construídas. Elas são todas encostadas umas nas outras que é pra melhorar a sustentação, e a inclinação pra frente é pra facilitar a subida de móveis, já que as escadas holandesas são famosas por serem estreitíssimas. Notei algo de estranho com as casas logo de cara quando chegamos à cidade, mas perguntei a Rafael e ele não percebeu (??? como pode?). Fiquei pensando que estava maluca, até que recebemos essa informação do pântano e a confirmação de que é tudo torto mesmo e não sou eu que estou doida sem fumar. Que bom.
Na primeira noite, pegamos um tram e descemos em Dam, na praça do palácio. Fomos andando aleatóriamente, seguindo o fluxo e, de repente nos encontramos em uma rua estreita, vitrine de um lado, vitrine do outro e, do lado de dentro, mulheres de roupa íntima desinibidamente se expondo para os olhos dos curiosos possíveis clientes. Estávamos no Red Light District. Me senti meio tímida naquele lugar. Nada de clima pesado nem tristeza, tudo parecia muito natural para todos. Mas eu fiquei com vergonha de olhar para elas, porque elas estavam sem roupa e olhavam de volta.
Prostituição é uma profissão legalizada na Holanda. As meninas tem idades e aparências variadas. A maioria tem um corpo bonito, mas um rosto nem tanto. Elas são registradas, pagam impostos e tem direitos como qualquer outro trabalhador. Teoricamente, são todas independentes. Cafetinagem é crime. O que elas ganham, elas levam. Um programa de 15 minutos custa, em média, 50 euros.
A história do bairro é de que, antigamente, bem próximo de lá, havia um porto, onde de tempos em tempos atracavam marinheiros cheios de dinheiro pra gastar e precisando de “carinho”. Sendo assim, as prostitutas já ficavam por ali mesmo, esperando por eles. O interessante é que, intencionalmente, no ponto onde termina o Red Light District existe uma igreja, que naquela época era católica, e que lucrava com as indulgências vendidas aos marinheiros, que depois de passarem meses trancados dentro de um navio, aprontavam bastante no Red Light e aí ali mesmo já pagavam, eram perdoados e saíam de alma limpa. Um inteligente esquema.
Não é aconselhável tirar fotos das moças, pois nem elas e nem seus seguranças gostam disso, e ambos podem reagir de maneira agressiva. Eles podem simplesmente xingar você e te obrigar a apagar as fotos, ou tomar a câmera/celular de sua mão e jogar no canal, etc. Não adianta ser esperto, o guia nos contou um caso de um cara que estava em um de seus tours e decidiu fingir que estava falando no celular, enquanto tirava foto de uma delas, quando foi surpreendido com um balde de flúidos despejado em sua cabeça. Vale ressaltar que elas não tem banheiro nos quartos.
Outro local bem característico da cidade é o famoso I AMSTERDAM. Fomos lá tirar foto, para provar que estivemos em Amsterdam. Ô lugar difícil pra tirar uma foto! Tem gente que fica querendo subir em todas as 10 letras, e não libera pra mais ninguém (confesso que fiquei com inveja, pois tenho pernas curtas e jamais conseguiria subir também). Dica: Vá ao museu de Amsterdam. Lá dentro tem uma réplica menorzinha que tá sempre vazia, e dá para pessoas pequenas subirem nas letras também e se acharem.
De frente para o I AMSTERDAM original, na Museuplein (praça do museu), fica uma piscina com umas esculturas “modernas” onde as pessoas ficam sentadas molhando os pés e conversando, enquanto suas crianças brincam e mijam tudo. Tem também um gramado enorme onde o pessoal se espalha, em torno do qual ficam o lindíssimo museu de Van Gogh, o museu Rijks e o concert hall. Não entrei em nenhum deles, mas dormi que foi uma beleza na grama.
De todos os lugares que fui, o mais marcante de todos foi a casa de Anne Frank. Foi lá que se passou a história contada em um dos diários mais famosos do mundo. Foi onde Anne e sua família se esconderam durante dois anos, na tentativa de não serem capturados pelo regime nazista que dominava a Holanda. Eles se escondiam em um anexo da empresa de Otto Frank, o pai de Anne, cuja porta era tampada pelo lado de fora com uma estante de livros, de modo que não dava para perceber que existia mais casa para o outro lado. Algumas poucas pessoas os ajudavam, levando suprimentos e outras coisas. Anne, que queria ser escritora, decidiu relatar tudo em seu diário após ouvir no rádio um ministro holandês pedir para que as pessoas guardassem relatos e arquivos coletados durante os tempos de guerra, para registro histórico. O museu é uma reconstrução do lugar onde eles se escondiam, e de onde foram tirados à força pelos nazistas e levados aos campos de concentração, de onde somente Otto saiu vivo.
Outra experiência interessante foi ter ido visitar uma das igrejas católicas escondidas. Quando a Holanda se tornou um país protestante, as igrejas católicas tiveram suas cruzes e tudo o mais que representa o catolicismo arrancados e a religião protestante passou a ser imposta. Por conta disso, aqueles que não queriam se converter passaram a praticar sua religião de modo secreto, em igrejas que foram montadas dentro de casas. Por fora, uma casa normal. Por dentro, uma igreja com imagens, cruzes, terços, bancos e etc.
Algumas dessas igrejas foram facilmente descobertas, já que ao fim das missas todos saiam da casa de uma vez, e era de se estranhar que, todo domingo, em um mesmo horário, uma grande quantidade de pessoas se reunissem em frente a uma mesma casa. Mesmo sabendo, as autoridades deixavam pra lá. Afinal, eles estavam gerando dinheiro para o estado e a igreja era escondida, então, né. Essa é a lógica da permissividade holandesa: não bulir com quem está quieto e gerando lucros. É a mesma lógica que funciona hoje em dia na relação do governo com a maconha.
Fui embora de Amsterdam apaixonada pela cidade e fascinada em como uma capital européia pode ser tão peculiar e mente aberta. As casas tortas, as bicicletas, a liberalidade, a quebra de tabus… tudo em Amsterdam é descontraído e relaxado, como deve ser.
Beijos!
Lenita